25.4.11

Da série anedotas do cerrado - nº 3

Passando as compras no caixa de um supermercado de bairro. De bairro não, de superquadra. Um supermercado de superquadra.
O alface, a manga, o limão.
- Quando um homem usa anel no dedo, ele é compromissado, né?
- Oi?
A operadora do caixa repete a pergunta. E já que a mãe da moça nunca conversara com ela sobre "esses assuntos", Mariana Raphael explica a simbologia das alianças. Mão direita, mão esquerda, dourada, prateada... Até menciona que homens podem usar outros tipos de anel, mas passa corrido por esse ponto pra não iludir a moça.
O suco de uva, o chá verde, o pão.
- Na esquerda então é casado...
- É (entonação "sinto muito, mas é").
A conta, o cartão.
- É sempre bom olhar as mãos, né?
- É.
Mariana analisa se deve aprofundar o tema e deixar a moça ainda mais ressabiada. Como era uma conversa séria, de mulher pra mulher, decide ser franca:
- Mas não é só isso, tem homens que não usam aliança e também são comprometidos.
A moça suspira. A nota, o desabafo:
- Os homens são sacanas. Às vezes, mesmo compromissados, eles dão em cima.
- É.
Silêncio, sacola, despedida. Mariana queria lhe explicar mais coisas sobre a vida. Mas não dava, tinha gente na fila.

15.4.11

Da série anedotas do cerrado

Quando se está numa faixa de pedestres sem farol em Brasília, os carros param pra você passar. Isso consta no Código de Trânsito Brasileiro, mas em São Paulo ninguém nunca leu tal artigo. Voltando ao planalto central, na faixa tem uma placa dizendo: "Pedestre, dê sinal de vida". Pelo jeito, só andar não deve ser um sinal de vida, mas ainda não consegui descobrir se devo dar um tchauzinho, uma dançadinha, um duplo twist carpado ou fazer algum outro tipo de performance na hora de atravessar. O que tenho feito é atravessar com um certo remelexo no corpo, um gingado que eu queria ter mas não tenho, requebrando a cintura, o quadril e as sacolas. Algo do tipo "Morena D'Angola que leva um chocalho amarrado nas canelas". É, acho que dá a impressão de que estou viva. Pelo menos nenhum carro me atropelou ainda.

***

Flanando em Brasília e falando sozinha.
- E aqui, o que será que é?
- Não sei... Mas tem índios... (entonação de criança surpresa contando um segredo).
Era a sede da Funai.

11.4.11

Para mim, escrever é uma brincadeira. Mas não qualquer brincadeira, é um cabo de guerra. De um lado o prazer, de outro a dor. A corda sou eu. Puxada e repuxada, me vingo nas palavras. A corda sou eu. Sou eu quem acorda as palavras adormecidas no silêncio da página em branco. E puxa, repuxa, enfileira, empurra, descarta, resgata, tortura - até a exaustão. Escrever, para mim, é uma brincadeira. Sádica, masoquista; não qualquer brincadeira.